segunda-feira, agosto 31, 2009
segunda-feira, agosto 03, 2009
CHUVA
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Eu desviava das pessoas e tentava não sentir a chuva e queria que parasse o barulho todo todo o barulho eu queria enfim era ter ficado mas algo me impeliu e por isso eu andava e então eu lembrava e o que eu podia fazer senão implorar por mais barulho por mais pessoas e carros dos que eu pudesse me desviar e eu bebia a chuva e já eu era a chuva e queria apenas escorrer e ser líquido pó etéreo alma me desfazer e nunca mais saber ou entender.
E você em sua crueldade era todos os carros e pessoas e sons os mais diversos era até você que eu ia e o caminho não tinha nunca teve fim.
Você me veio fácil e mais fácil eu te perdi você está onde agora vc realmente existiu não não nem vem vc não existiu eu agora corro e são apenas carros são pessoas é a chuva é deles que eu corro eu corro só de coisas reais de você eu não corro você não é nem nunca foi você é apenas o que poderia deveria ter sido você nunca será.
Então por que eu corro por que eu já morro por que eu sinto a presença da morte ao pensar em você se você não é?
Moço, me dá um café, moço. As pessoas apostavam em mim, o senhor sabia disso? Para aquelas pessoas, eu teria dinheiro suficiente pra quantos cafés quisesse, em padarias muito mais relevantes que a sua, eu teria trocos pra comprar um cafezal e te pagaria, moço, eu compraria essa espelunca só pra te despedir. Você não é nada nem ninguém pra falar nesse tom comigo. Eu estive quase lá, saiba bem o senhor. E agora eu tenho que estar aqui e estou. Não se nega um café a quem tanto deseja dormir. Não se nega. Me dá um café, moço, me dá.
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Irmãos das estrelas
Lá fora, chove. Os gatos passeiam pelos canos. As gotas escorrem, cada uma no seu tempo, poliritmia. Enlouquece o relógio que derrete como plástico. O tempo está morto.
Tanta água na cidade, tanta eletricidade que é como se você estivesse de frente para o mar. Íons são liberados, o sinal de rádio passeia com limpidez, você olha pela janela do carro e vê um desenho impressionista no pára-brisa. A chuva escorre como mercúrio, formas são criadas e desaparecem em seguida.
Nos conhecemos desde o tempo das estrelas, lembramos do futuro com flashs delineados por neon. Pensamentos tornam-se hologramas, ouve-se um ruído branco subindo pela rua até o alto dos prédios. O skyline tremula. Helicópteros se jogam no vazio.
O ruído vira um som harmônico. Se esta música tivesse uma cor, ela seria lilás. A chuva lava a cidade como guache. E não resta mais nada atrás ou dentro nas nuvens. Só o vazio.