sábado, abril 14, 2012

Outono III

Oi, pai,

Tudo bem aí? 
Vc viu que não deu certo de novo? Tudo o que escrevo (menos as petições, ainda) soam como um pedido de desculpas pra ela, por não ter dado certo. Até essa carta pra vc começa assim. Eu queria muito que tivesse dado certo, vc sabe, né? Mas não deu.
Eu pensei nesse post hoje cedo, lembra? Pensei que começaria assim mesmo: oi pai, tudo bem aí? E então eu falaria coisas condizentes com o meu estado de espírito de manhã. E o que acontecu? Esse estado mudou e mudou e mudou e mudou ao longo do dia, assim como tem acontecido nos últimos dias, nas últimas semanas e, mesmo, meses.
Sigo pensando em vc todos os dias, vc viu? E lembro sempre de vc falar a mesma coisa em relação ao vô. 
Fiz essa bobagem hoje, né? Entrar na pilha do advogado da parte contrária... mas já foi. A raiva maior é que não sou mais principiante, não tinha esse direito de errar de novo. Mas já foi. Se a gente pensar bem, é reflexo de minhas atitudes em todos os campos da vida, não é mesmo? Não vou me preocupar tanto com isso, pai, não mais.
Estou gostando desse meu novo critério: jogar limpo, falar claro, ser aberto e transparente com todos. Vc era assim... mas isso gera problemas, desconforto. Nem todos estão preparados pra essa transparência toda. E eu nem sempre sei como ser transparente e gentil, com concomitância. Mas não vou mudar, por enquanto. Ao contrário: vou potencializar isso. É muito pouco político, mas é muito gostoso viver assim. Essa liberdade.
Não vou abrir mão dessa liberdade, em qualquer circunstância. Ainda que um dia esteja novamente casado. O que duvido muito, hoje. 
Estou bancando as escolhas e o direito de não escolher. Estou bancando os meus desejos. Não vou sair das balizas, claro, porque ainda não pretendo ser antissocial. Mas o importante deixou de ser a aprovação dos outros, ao menos naquela intensidade. Poxa vida, hein? Bem que vc podia estar vivo pra gente falar sobre isso num diálogo. Não tenho mediunidade desenvolvida... Mas enfim, um dia a gente conversa. 
Nossa, pai, como tá complicado tudo. E daí me vem uma das tuas frases preferidas: a vida é simples, a gente que a complica. 
Está tudo sólido na família que vc deixou. Com um provável novo integrante, já muito bem integrado. Tenho certeza de que vc gostaria muito dele. Parecem ter o mesmo estilo. E ela tá muito feliz, dá gosto de ver.
E o lance do sonho, hein? Vc estava lá protegendo-a, de três. Vc sempre nos protege, eu sei, mesmo sem ter mediunidade desenvolvida. 
De resto, os planos, não é mesmo? A motoescola, o jack kerouac, a route 66, o arizona, o grand canyon, o cursinho, os concursos, o canto, aquele projeto lá que só nós dois sabemos, o violão elétrico, a percussão, os novos caminhos, tudo. 
Saudade de vc, sabia? Sempre. Poucas vezes doi. Ficou a saudade boa. Ficaram os teus frutos, a tua solidez. Vc continua, né? Isso é muito bom. 
E o baiano que falou pro velho que me falou aquelas coisas todas bonitas? E esse preconceito que envolve, essa ignorância generalizada... Emprestei aquele livro que te dei pro pessoal fazer o culto. Viva a utilidade, né? Sei o quanto vc gostava da tua biblioteca, mas sei que gostaria desse destino para aquele livro. Fui eu que te dei o livro? Ou vc comprou em Salvador? Nem lembro mais. 
Eu vou dormir, pai. Me ajuda com aquelas coisas? Obrigado, sabia que podia contar. Eu sempre vou poder.
Um beijo. 
E bom outono, daí de cima.